Uma noite que reuniu cultura, arte, educação e reflexão, no evento realizado nesta segunda-feira (22), no Teatro Municipal Trianon, pelos 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher, uma iniciativa da Subsecretaria Municipal de Políticas para Mulheres em parceria com a Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima e o Grupo Nós do Teatro. Após encenação do teatro documental “Boca”, uma roda de conversa abordou o tema da violência contra a mulher e, em seguida, a cantora Luciana Ribeiro fez participação especial, aberta com capela da música “Dona de Mim”, sucesso na voz de Iza, sua técnica no The Voice Brasil 2020, que traz uma mensagem do empoderamento feminino.

A peça é uma criação coletiva inspirada na obra poética “Outros jeitos de usar a boca”, de Rupi Kaur, com inserção de textos de Marta Medeiros, José Saramago, dados estatísticos e canções brasileiras como Cálice, de Chico Buarque. Na encenação, as violências psicológica, sexual e física sofridas pela mulher são apresentadas em fragmentos que trazem momentos de reflexão do Ser mulher no mundo contemporâneo e as angústias das mulheres que sofrem violência. Em cena, Liana Macabu, Samyla Jabor e Kátia Macabu, que também dirige a peça, e os atores Jonas Defante e Anderson Cabral.

Ao final da roda de conversa, Luciana Ribeiro cantou, ainda, os sucessos “What’s Up”, de 4 Non Blondes, e “Lost on You”. A apresentação contou com acompanhamento de Vinícius Cardoso no violão. Também participaram a delegada da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam), Ana Paula Cavalho; a ex-presidente do antigo Núcleo Integrado de Atendimento à Mulher (Niam); Vera Coutinho; a Subsecretária de Desenvolvimento Humano e Social, Mariana Barboza; Subsecretário de Segurança Pública, Marcos Moreira; o comandante da Guarda Civil Municipal, Wellington Levino, e o vereador Leon Gomes.

A subsecretária Josiane Viana agradeceu a presença de todos e a participação do grupo de teatro. “Todos nós somos responsáveis pelo enfrentamento da violência contra a mulher, a menina, o idoso. É uma responsabilidade que eu divido com vocês. A subsecretaria é um equipamento novo, que o prefeito Wladimir Garotinho criou. É um sonho de todas nós, mulheres, ter um equipamento voltado para nós e, recentemente, a gente instalou o Ceam, inaugurado no dia 22 de setembro, que era um desejo ainda maior, um equipamento especializado no combate à violência contra a mulher”, afirma Josiane, ressaltando ainda que o Ceam conta com equipe multiprofissional para retirar a mulher do ciclo da violência.

RODA DE CONVERSA – Formada por Josiane Viana; a presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher (Comdim), Manuelli Ramos; a cantora Luciana Ribeiro, que deu depoimento sobre relacionamento abusivo que viveu no passado; a professora de Artes, Beatriz Coutinho, que desenvolveu no Colégio Estadual Nelson Pereira Rebel o projeto “Marias não se calem”, que contou com exposição que também homenageou a professora Regiane da Silva Santos, vítima de feminicídio em 2019 pelo ex-marido. Um ano antes do crime, Regiane foi uma das 10 mulheres a dar o depoimento para o projeto da escola.

Na roda de conversa também estavam a mestre em Serviço Social e pós-graduanda em Direitos Humanos, Saúde e Racismo, Jessica Gomes dos Santos, e a psicóloga Roberta Dieguez, que atua no Programa de Saúde Mental, da Secretaria de Saúde. A mediação da roda de conversa ficou a cargo de Kátia Macabu. “Sentimos hoje que estamos mais fortalecidas para falarmos sobre isso. Essa luta não é só da mulher. É da sociedade brasileira. Todos precisam nos empenhar para que estas cenas como a que vocês viram na peça não voltem a acontecer”, disse Kátia.

As mulheres falaram sobre a importância da luta permanente para ocupar um espaço de protagonismo em uma sociedade considerada machista e da importância da educação neste contexto de formação de uma nova cultura anti-machista, envolvendo jovens. A presidente do Comdim convidou a atriz mirim Kamile Vitória, do grupo Grupo Oficina de Texto Terra da Alegria (Gotta) para uma performance de uma fábula. A participação dela foi finalizada com a seguinte mensagem “Mulheres, virem a página e sejam protagonistas da sua própria história”.
- Faço usufruto das políticas públicas de mulheres. Quero que, mais que a gente reflita e tenha consciência dessa violência, que a gente parta para a ação, porque acredito na transformação a partir da luta coletiva. Ensinar meninas tão jovens a serem protagonistas de sua própria história, a não aceitar violência, é também forma de combater o machismo, a misoginia, o racismo. Que isso nos toque – disse Manuelli.

Luciana Ribeiro falou de sua experiência de relacionamento abusivo, que acabou sendo compartilhada durante sua participação em um programa de abrangência nacional, após ser questionada sobre o motivo de só cantar há um ano. “Eu fiquei receosa antes de me expor em rede nacional e falei que tinham alguns motivos de me impediam de cantar. Foi quando Lulu Santos me perguntou se eu poderia falar quais seriam esses motivos. Aí, eu pensei: foi através de um vídeo na internet de alguém que me alertou que eu percebi o que estava vivendo. Então, eu pensei: eu preciso alertar outras mulheres também”, disse a cantora, se referindo a um dos motivos que a fez perceber que estava vivendo um relacionamento abusivo porque a impedia de exercer a arte que amava.

A assistente social Jéssica Gomes relatou que, além da vivência profissional, também, já presenciou situações de violência doméstica com casais próximos desde muito cedo, até descobrir que aquela realidade era muito maior. A psicóloga Roberta Dieguez, Mestre em Saúde Coletiva, está há cinco anos no Programa de Saúde Mental, e fez uma abordagem sobre o cotidiano do atendimento ambulatorial. “A violência psicológica é muito difícil de ser percebida e é um trabalho muito árduo com a paciente. Às vezes, a mulher não continua e, até mesmo, a pedido do companheiro, ela abandona o tratamento”, disse a psicóloga, lamentando que, muitas vezes, não se chega à raiz do problema porque uma mulher que vivencia uma situação de violência acaba sendo tratada com depressivo, deixando as questões da violência sem solução.